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quarta-feira, 29 de junho de 2016

Gricerina Punk/Hardcore, da Zona Leste Sem Medo De Ser Contundente.

Formada em meados de 2007 na periferia da cidade de São Paulo, bairro Cohab 2, situado na região de Itaquera, o Gricerina iniciou suas atividades como a maioria das bandas de punk rock como uma forma de diversão e descontração, após muitas mudanças de formação,muitos altos e baixos eles lançaram seu primeiro Full Álbum em 2011 intitulado "Mais um dia de Loucura Chegando" sendo muito bem recebido pelo publico e tendo um ótimo retorno na cena gerando muitos shows dentro e fora de SP , atualmente os caras se encontram realizando muitos shows além de prepararem seu segundo trabalho  com o nome de "Paulada na Lata" , entrevistamos os caras para sabermos um pouco mais sobre este novo trabalho e muitas outras histórias , confiram abaixo.










1-(Salada Itinerante) O Gricerina foi formado em meados de 2007 de lá pra cá muita coisa mudou , formações diferentes , novos trabalhos ,  inclusive a musicalidade  ficou bem mais pesada com elementos de Crossover e Thrash Metal  , gostaria que fizessem uma paralelo da evolução da banda ao longo dos anos?

1-(Gricerina) Em 2007 quando formamos a banda, éramos apenas adolescentes fãs de punk rock aprendendo a tocar. A entrada do Jonas e do Tunico, que já possuíam uma bagagem musical maior, foi o principal fator da evolução da banda e do nosso estilo. Nosso aprimoramento musical e nosso amadurecimento pessoal fizeram com que naturalmente nosso som mudasse. Incorporamos novos elementos e uma complexidade maior aos arranjos, sem perder a essência punk nas letras.
Não nos limitamos a rótulos e nem a mesmice. Temos a necessidade constante de renovar, sem medo de arriscar e nem de misturar estilos distintos.











2-(Salada Itinerante) Praticamente todos os integrantes da banda são do bairro Cohab 2 , situado na região de Itaquera , extremo leste de SP, esta forte influencia das vivencias na periferia e dos contrastes  sociais da grande metrópole que é São Paulo , como é para vocês retratar estas experiências nas musicas da banda ?


2-(Gricerina) Não escolhemos onde vamos morar quando nascemos, temos que observar e aprender com a realidade de que viemos, e as origens são o que fazem as pessoas, como vão se comportar, vestir, dialogar e se colocar diante da sociedade. A realidade da periferia é absurda, muitos dos hospitais que dão acesso ao público tem condições precárias de atendimento. Muitas pessoas sem estrutura nenhuma. Há lugares em que a água chega até o teto, pessoas desabrigadas nas ruas e com frio, e viemos disso. Mas a periferia é rica em arte e cultura. É difícil encontrar oportunidades diante dessa realidade, então lutamos por isso. Queremos ver os acessos, colocamos em nossas letras o protesto de cada cidadão periférico, as pessoas se identificam com o som porque se sente como nós. Querem também se expressar, nosso país se encontra em um constante protesto, nossa situação política nos envergonha. Queremos a mudança, a melhora da nossa quebrada principalmente. O protesto em cada verso e em cada nota é pelos nossos.



3-(Salada Itinerante) Como funcionou o processo de composição ,gravação e mixagem das musicas que integram o ultimo trabalho de vocês  o álbum “ Mais um dia de Loucura Chegando” em qual estúdio foi gravado o trabalho , e como este álbum foi aceito pelo público em geral ?



3-(Gricerina) Nosso primeiro trabalho teve diversos compositores como, por exemplo, o fundador e antigo vocalista da banda Giovanni Perez, e também músicas de bandas que já pararam suas atividades, porém marcaram época e optamos por regravar para sempre reviver aqueles momentos (Krowd, Órfãos da Nação). O álbum foi lançado no Luar Rock Bar, casa referência para cena underground, casa lotada e todos saindo com seu CD, a partir daí vieram muitas conquistas devido à aceitação e divulgação dessas mesmas pessoas que estavam nesse dia marcante. Gravado no antigo Fábrica SP em dois dias rs (isso mesmo, dois dias) sem intervalos. Superaram todas nossas expectativas e nos colocou em muitas casas que sempre sonhamos em tocar.








4-(Salada Itinerante)  Recentemente vocês abriram um  show de uma das maiores bandas do estilo dentro do nosso pais o Ratos de Porão , durante o circuito SP de Cultura no PQ Raul Seixas , praticamente quintal da casa de vocês , durante o show  percebi que mesmo a galera que não conhecia a banda  agitou do começo ao fim , foi certamente uma verdadeira aula de Hardcore naquela tarde , como foi para vocês este show as expectativas e a repercussão que rolou depois dele ?


4-(Gricerina)  A expectativa para esse show era muito grande, sabíamos que precisávamos fazer o nosso melhor, estaríamos no “quintal de casa”, ensaiamos duro para que tudo desse certo e ficamos surpresos com o resultado. Aquela galera toda esperando para ver uma das maiores bandas da cena punk e quando se deparam com o peso do som, a roda de bate cabeça, todo mundo agitando, foi gratificante todo o esforço colocado para tal ocasião. O impacto foi tão grande que teve gente afirmando que “o show de vocês foi melhor da noite”. Não era nossa ideia, mas críticas sempre serão bem vindas para a melhora de nosso trabalho. Superamos nossas expectativas. Ao passar dos dias, nas ruas, vieram muitos elogios do show, e em cada um desses, mais motivação para continuar.  O show deu força total para a gravação do “Paulada Na Lata” que sai nesse próximo semestre.



5-(Salada Itinerante ) Como vocês vem a Cena Punk/Hardcore  atualmente , muitos veem com um certo pessimismo  chegando a declarar que o punk morreu .Qual é a opinião de vocês quanto a isso ?


5-(Gricerina)   Antes de tudo, o punk não morreu e nunca morrerá. A cena ainda vive sim, enquanto existir desigualdade social e de classes na sociedade, o punk sempre estará lá pra ser aquele símbolo/espírito/atitude que move a gente e, assim como tudo dentro do sistema, é uma peça fundamental dentro de uma "democracia" como eles chamam aqui. Logicamente como tudo em todas as eras teve seu auge e tempos de glória e bandas que movimentaram o país e a cabeça dos jovens naquela época, isso sem as facilidades de hoje em dia como a própria popularização da internet no país, é fato que tivemos grandes perdas como o Redson (Cólera), do qual tivemos o prazer de dividir os palcos e bastidores com essas ideias e descontração e serviram pra gente também como um aprendizado tanto musical como pessoal e falando de música, a cena continua rolando e vai rolar por muitos e muitos anos. Temos excelentes bandas em atividade há mais de 30 anos e bandas novas que vem com esse mesmo espírito mantendo essa "chama" acesa. Hoje em dia é mais fácil o acesso a casas de cultura e ONG's para realização de shows e apresentações de várias vertentes artísticas e movimentos culturais das regiões mais isoladas de São Paulo e região, porém, ainda há muitos "chacais" por assim dizer, que sugam essas bandas com valores e condições absurdas para poderem apresentar seus trabalhos e assim disseminar suas ideias, isso também enfraqueceu a cena, mas perdeu força de uns anos pra cá com as prefeituras de cidades vizinhas facilitando espaços para apresentações e gerando editais para artistas autorais da cena também se apresentarem e terem o devido respeito pelo trabalho apresentado.



6-(Salada Itinerante )   Estive vendo alguns Clipes da banda tanto “Rolé na Augusta “ quanto “Botinada”  ambos tem um gravação e uma edição muito boa , como foi os bastidores da produção destes clipes e quem ficou encarregado deste trabalho ?


6-(Gricerina)  O clipe rolê na Augusta foi um marco crucial pra banda. De lá vieram prêmios como melhor single de 2013 pelo Zona Punk. Foram uma das aventuras mais doidas já passadas pela banda. Anunciamos a gravação e todos os amigos estavam lá, além de pessoas que se ajuntaram a festa sem nem saber do que se tratava. Resultado: Rua Augusta parada 3 vezes. Esta parceria junto ao Itaquera na Cena proporcionou o clipe, até o momento, mais louco da banda.
Ver que jovens e crianças estão lá balançando a cabeça é um dos ápices da banda. Alguns estudantes até se propõem a fazer alguma matéria, vídeo ou algo da banda. Este é o caso do clipe Botinada feito por um estudante de artes visuais Jairo de Sousa, um convite feito um dia antes em que abraçamos para ajudar um estudante e saiu esse belo resultado.

7-(Salada Itinerante) Tanto o Punk rock quanto o Hardcore sempre tiveram uma postura politizada e radical frente as “maracutaias” que ocorrem-na politica e na sociedade ,  gostaria de saber o que vocês pensam sobre o que esta ocorrendo no cenário politico atual e qual o posicionamento da banda frente a isso ?


7-(Gricerina)  Esse é o nosso assunto predileto "rs".
Em quase todas as músicas da banda abordamos o assunto política. Desde a formação da banda o intuito já era formar opinião, como é de costume em nosso gênero musical. Nossa opinião política sempre foi radical. Somos a favor de uma reforma política e constitucional que nos inclua. Que inclua o povo da periferia, e acolha com atenção nossas causas. A política sempre foi e ainda é muito elitizada no Brasil. Precisamos de mais dos nossos nos representando e que os mesmos não se corrompam.
Tentamos fazer nossa parte, e através da música, enfatizar e fortalecer nossa causa.
Nossas letras adolescentes de 10 anos atrás ainda não saíram de moda, pois vivemos a mesma situação política em que assistimos de longe as decisões sendo tomadas, e de longe pagamos pelos equívocos e pela supremacia de nossos governantes.
Hoje o país vive uma situação política mais calorosa, onde o povo foi rachado em dois lados, exatamente como eles (os malditos políticos) queriam. Mesmo com toda essa turbulência não mudamos nossa opinião. Não somos a favor do golpe que foi dado a nossa democracia, porém não somos a favor do governo anterior. É aquela velha frase "tudo farinha do mesmo saco".
Seguiremos sempre firmes e fortes na abordagem desse assunto, até um dia chegar numa igualdade da qual não teremos do que reclamar. Isso é utópico, mas sem esse sonho nossas letras perderiam o sentido.






8-(Salada Itinerante)  Quais os planos para a banda para este próximo semestre de 2016 ,  e o que vocês preparam para o ano que vem já que faram 10 anos de carreira , já existe algo pensado neste sentido , uma data destas tem que ser comemorada?


8-(Gricerina)  Para o próximo semestre vamos gravar o play novo. Vamos retratar nas músicas situações rotineiras na vida dos brasileiros que dão um tapa na cara na parte política/social do Brasil que vem há anos com as mesmas pessoas no poder e com os mesmos problemas, além da fé sendo "cobrada" por assim dizer, será o PAULADA NA LATA, 7 músicas inéditas com uma pegada bem pra frente. Algumas dessas músicas nós já tocamos nos shows como as músicas "Adoradores do Estado e do Capeta", "EDIR Selvagem" e a que intitula o cd (uma das nossas preferidas) "Paulada na Lata", que em 2013 quando foi escrita citou antes da copa do mundo o vergonhoso 7x1 da seleção canarinho. Agora falando sobre os dez anos, sim vai rolar uma festa (risos). Ainda não temos nada confirmado, mas temos uns planos rolando. Acreditamos que no ano 13 de vida da banda vem um DVD, mas aguardem novidades e shows esse ano e o show de lançamento nesse segundo semestre.



9-(Salada Itinerante) Vocês vem realizando algumas apresentações no interior de SP  , geralmente os fãs de hardcore do interior do estado são bem mais calorosos , como vocês analisam o publico da cidade de SP e o publico do interior , vocês acreditam que existe uma diferença entre eles  ou é muito semelhante?



9-(Gricerina)  O que percebemos é um público mais honrado ao trabalho que a banda faz, ele admira e quer até mesmo ajudar com um simples "nossa obrigado por essa sonzera" talvez mais caloroso no interior pela falta de bandas diretas que condizem com a realidade.






10-(Salada Itinerante) Deixem um recado para a galera que acompanha a banda já a algum tempo e para a galera que esta começando a curtir o som de vocês agora , desabafem , enfim o espaço é de vocês ?


10-(Gricerina)  Agradecemos muito ao Salada Itinerante  pelo convite e as ótimas perguntas construtivas e a você que acompanhou até o fim e vem nos acompanhando, nosso recado principal é para os jovens montarem  suas bandas, acreditar é agitar, fazer propagar suas idéias.
Acessem nossa página no Facebook e aguardem que em breve terá novidades.
Obrigado e grande abraço da família Gricerina (GriGri rs)
www.facebook.com/gricerina







Clipe Oficial  "Rolé na Augusta".







 Full Album "Mais um dia de loucura Chegando"










Formação Atual 




Jonas Henrique (guitarra)

Tunico Fernandes (Baixo/Backing vocals)
Raul Expindola (Bateria)
Yuri Lescano (Vocal)

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quinta-feira, 16 de junho de 2016

Raul Seixas - Krig-ha, Bandolo! (1973)








``Cuidado, aí vem o inimigo!`` anunciava o título inspirado no grito do Tarzan. E o aviso era procedente. Desde os primeiros gritos de um Rauzito de nove anos cantando rock dos anos 50 num gravador caseiro como se estivesse apresentando-se numa rádio na vinheta que abre o disco até o último suspiro de ``Ouro de Tolo´´, tudo em ``Krig-ha Bandolo!``é anti-sistema. Personagens da história se misturam a notícias da época em letras embuídas de filosofia, deboche e inconformismo, muitas delas assinadas junto com o parceiro Paulo Coelho (na época um jornalista novato na matéria de compor letras de músicas que estava recebendo aulas de Raul. E aprendendo rápido!), numa linguagem simples e direta. A música é calcada no rock n´roll, na música nordestina e em baladas certeiras. O Brasil agora tinha o seu próprio Bob Dylan. E com sotaque baiano.
Apesar desse ser o primeiro disco-solo do cantor, Raul não era um principiante quando chegou à Philips (gravadora que na época tinha em seu cast nove em cada dez grandes estrelas da música nacional) pelas mãos de Roberto Menescal - produtor do disco ao lado de Mazola - para gravar, já havia gravado dois discos (um com os Panteras e outro com o projeto Sociedade da Gran Ordem Kavernista - ao lado de Sergio Sampaio, seu afilhado musical) , trabalhando como produtor musical e chamado atenção num Festival Internacional da Canção ao defender a sua "Let me sing, let me sing". Agora seu princípio havia chegado ao fim. Com o estúdio nas mãos e o microfone ao alcance da voz, Raul pode dar vazão às suas idéias musicais e utilizar a música para propagar seu ideal de mundo. Dizia ter a fórmula do sucesso. Depois da vinheta, o ouvinte se depara com a voz de Raul zunindo o recado de que ele era a "Mosca na sopa", entre berimbaus e atabaques, seguindo num indo e vindo de rock e candomblé. Perturbante e perturbador como uma mosca. Nada mais anti-sistema. Se musicalmente, o disco segue mais normal, na medida do possível, as letras continuam viajando por lugares incomuns aos letristas pop. Em seguida vem "Metamorfose ambulante", outro clássico da música brasileira (o disco tem quatro!), com sua letra que reflete sobre as transformações constantes da mente, filosofia heraclítica em formato de música popular; "Dentadura postiça" mostra o sobe e desce de crenças, filosofias e costumes na bolsa dos valores sociais; "As minas do rei Salomão" - que recebeu uma versão mais de acordo com a sua letra no Lp "Há dez mil anos atrás" - traz Cervantes e esoterismo numa pegada country e a balada "A hora do trem passar" mostra que os calados e os medrosos de falar estavam perdendo o trem , destaque para o belo arranjo do maestro Miguel Cidras . E isso é apenas o Lado A. O segundo lado traz "Al Capone", um rockão cheio de personagens históricos e metáforas que conclui que através da analise de acontecimentos poderemos prever o futuro e escapar das armadilhas do "Monstro Sist" ("Eu sou astrólogo e conheço história do princípio ao fim..."); "How could I know", uma baladaça em inglês que Raul dizia ter feito para que seu ídolo Elvis Presley gravasse; "Rockixe" com suas misturas e uma letra bem ao estilo Paulo Coelho ("O que eu quero, eu vou conseguir..."); "Cachorro Urubu", parceria nunca mais repetida com Zé Geraldo, uma balada no estilo folk com referências à Primavera de Praga, aos estudantes franceses de 68 e a difícil guerra dos jovens, numa estrada comprida e sem saída, contra o sistema. E depois de tudo isso, o melhor ainda está por vir: "Ouro de tolo". Pra fechar o disco apoteoticamente, Raul guardou sua letra mais visceral. Numa canção pastiche de sucessos recentes da dupla Roberto/Erasmo (Sentado a beira do caminho/Detalhes), Raul debocha, ironiza e tripudia nos valores do Regime Militar, com seu nacionalismo e seu milagre econômico, e da classe média brasileira, com suas aspirações, seu materialismo, seus status. E isso em pleno governo Médici. Golaço da contracultura contra o obscurantismo. "Ouro de tolo" ganhou as paradas - o cantor fez seu lançamento em praça pública, causando tumulto no centro do Rio de Janeiro - e rapidamente atingiu o topo das paradas. O povo adorou Raul. Sua irreverência, seu humor, sua inteligência, seu carisma fora do comum. Daí pra frente, o Lp ganhou as paradas de sucesso, emplacou outras músicas nas paradas e Raul vôou alto.Transformou fãs em discípulos, teve que se mandar do país, gravou outros álbuns geniais, tornou-se um dos compositores mais perseguidos pela censura, brigou com quase todas as gravadoras, esgotou sua fórmula, caiu no ostracismo, desencarnou e virou uma figura única dentro da música brasileira. Um mito!
Mas foi no grito de guerra de "Krig-ha, bandolo!" que a semente foi lançada e a chave da Sociedade Alternativa começou a abrir a cabeça do mundo...




(Texto: Leandro L. Rodrigues)



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quarta-feira, 15 de junho de 2016

Caetano Veloso - Caetano Veloso (1968)








Quando o grupo argentino Beat Boys tocou a introdução de ``Alegria Alegria´´ no teatro Record numa noite de 1967, a musica brasileira entrou em transe. Conduzida por guitarras elétricas e com uma letra moderna, cinematográfica, cheia de referencias a ícones da cultura pop e da vida moderna, a marcha, quase uma paródia de ``A Banda´´, vencedora do festival anterior (o que já era uma pista da intenção de um evolução), defendida por um Caetano Veloso de terno xadrez marrom e camisa gola rolê laranja, em oposição aos smokings habituais, fez com que público (que a princípio vaiou), crítica e concorrentes viajassem no tempo e no espaço. E quando voltaram, o ponto em que estavam acomodados não existia mais. As barreiras entre o rock e a música brasileira estavam rompidas. A Jovem Guarda com seus caderninhos e namoradinhas estava com os dias contados. A Bossa Nova já não era mais tão nova assim. Começavam os tempos do tropicalismo...
O happening de "Alegria, Alegria" e "Domingo no parque" (de Gilberto Gil - irmão musical de Caetano - e defendida pelo cantor e Os Mutantes com arranjos do genial maestro Rogerio Duprat)no melhor festival de música brasileira de todos os tempos, abriu as portas para que o tropicalismo tomasse forma. "Alegria, Alegria" ficou em quarto lugar e a canção de Gil em segundo. Por isso quando o segundo Lp de Caetano chegou às lojas em janeiro de 1968, com sua capa colorida, bem ao estilo psicodélico que dominava o rock mundial, o público já sabia que a fase gilbertiana de "Domingo" - seu primeiro Lp dividido com Gal Costa - havia ficado pra trás. O Caetano de então era um astro pop, um compositor de ousadia estética que desafiava o pensamento conservador dos militares instalados no poder e questionava seus conceitos de ordem: "Por que não?" .E em tempos de não, os tropicalistas optavam pelo sim. Aceitavam em seu caldeirão toda e qualquer referência, todos os estilos cabiam nas suas músicas. A antropofagia de Oswald de Andrade aliada aos conceitos de pop art e aldeia global de Andy Wharol e McLuhan era o que os guiava. E quem levasse o disco de Caetano pra casa, constataria isso. No Lp, cheio de cores e nomes, trafegavam automóveis que pareciam voar ao lado de atrizes de cinema, ícones da música brasileira, existencialismo, Coca-Cola, programas de Tv, personagens de quadrinhos, cinema novo, revolução cubana, o Brasil rural e o Brasil moderno. A música, entre outras coisas, tinha pitadas de rock inglês, samba-canção, música latina, marcha-rancho, bossa-nova e música de vanguarda.
O início do Lp trazia uma brincadeira do baterista Dirceu testando o microfone em meio a barulho de aves, essa era a abertura de "Tropicália", a canção. Primeiramente batizada como "Mistura Fina", marca de cigarros que Caetano fumava na época, a música recebeu seu título definitivo, e que acabou sendo o mesmo do movimento que ele organizava, inspirado numa obra - um labirinto - do anárquico artista plástico Helio Oiticica (autor também da frase "Seja marginal, seja herói", muito usada pelos tropicalistas). Com arranjos do maestro Julio Medaglia e seu clima tenso, é uma irmã próxima de "Alegria Alegria" com sua letra glauberiana que junta os ídolos da música brasileira do momento (Roberto Carlos, Elis Regina e Chico Buarque) com Carmen Miranda, a bossa de Noel e a música da roça. Um verdadeiro cartão de apresentação do seu movimento bem moderno. Em seguida "Clarice" - a preferida do produtor Manoel Berenbein - com letra de Capinan, atacando a caretice e a castidade, e cheia de mudanças de ritmo, foi definida por Caetano como uma "canção monstra", "com um pedaço nada a ver como outro". "No dia em que eu vim-me embora", canção feita em parceria com Gil, traz ecos de rock inglês, com um destacado teclado, e uma letra que é uma crônica - talvez autobiográfica - sobre a saída de um rapaz do interior rumo à capital com uma reflexão existencialista sobre acontecimentos que são marcantes na vida do indivíduo e porém não significam nada para o mundo ("No dia em que eu vim-me embora não teve nada demais"). A já conhecida "Alegria Alegria" parece mais normal com seus pares no Lp que com suas concorrentes no festival. O bolero "Onde andarás", com letra de Ferreira Gullar, mistura o jazz west coast de Chet Baker com Nelson Gonçalves. "Anunciação", parceria com Rogério Duarte, empresário do cantor e autor do desenho da capa, alarga o psicodelismo e "Superbacana", um rock cheio de gírias e referências, é tocada pelo RC7 (banda de Roberto Carlos na época) ; a construção do Aterro do Flamengo como mote para "Paisagem útil", um intertexto - recurso usado com frequencia nas letras do compositor - com "Inútil paisagem", de Tom Jobim, que reflete questionador sobre as modificações causadas pela modernidade. Destaque para o cantor parodiando o estilo de Orlando Silva em determinadas partes. "Clara" traz de volta o som mais tradicional do álbum "Domingo", associação reforçada pela participação de Gal Costa. "Soy loco por ti América", música feita por Gil e Capinam no dia da morte de Che Guevara, exalta em ritmo de rumba os ideiais revolucionários de uma unidade latinoamericana cantanda em encantador portunhol ("("El nombre del hombre muerto/Antes que a definitiva/Noite se espalhe em Latino américa/El nombre del hombre es pueblo") que materializa na forma a união sonhada no conteúdo. Uma "Ave Maria" em latim com um belo violão (que a falta de importância dada à ficha técnica na época não permite saber quem toca) abre alas para o apoteótico encerramento com "Eles", outra parceria dele com Gil. Tocada pelos Mutantes a canção com ares de repente trata do maniqueísmo ("Falam com franqueza do bem e do mal/Crêem na existência do bem e do mal) e da hipocrisia vigente no país ("Alegres ou tristes são todos felizes durante o Natal") em meio a viagens da guitarra de Sergio Dias e do orgão de Arnaldo Baptista. No final, Caetano encerra dizendo o que se constataria pouco tempo depois:"Os Mutantes são demais!"
Alguns meses após o lançamento desse disco, Gilberto Gil lançaria o seu, gravado em companhia dos Mutantes e de Rogerio Duprat, e os tropicalistas todos juntos lançariam o histórico disco manifesto "Tropicália ou Panis et circenses" que entrou pra história como o "Sargent Peppers" brasileiro. Dez anos depois de João Gilberto (ídolo máximo de Caetano) conduzir a música brasileira à modernidade, a Tropicália a virava outra vez de pernas pro ar. Só que o Brasil de Costa e Silva já não tinha mais nada a ver com o de JK e a postura andrógina e cada vez mais anárquica de Caetano e Gil não combinaram nem um pouco com o conservadorismo dos militares e da direita, a esquerda com suas violas e boiadeiros também não viu com bons olhos o internacionalismo (vejam que contradição!) de seu som e o grande público, sem acesso à maioria dos elementos culturais que formavam o som e a atitude tropicalista, também pouco entendeu. A cabeça de Caetano e Gil avançava rápido demais para a velocidade em que andava(?) o país. Presos no final de 1968, com o endurecimento do regime, os dois foram expulsos do país e, por sorte ou por castigo, pararam em Londres, aonde aprenderam in loquo as lições do pop e do rock inglês até voltarem consagrados nos braços do povo - que só então começava a assimilar as lições tropicalistas.
Se hoje, Caetano é reconhecido como um dos principais compositores da música brasileira, adorado internacionalmente por artistas que vão de Beck a Almodóvar , esse disco, unanimidade nas listas dos discos mais importantes da história, foi o pontapé inicial. Foi com ele que Caetano deflagrou a última grande revolução da música brasileira...



(Texto: Leandro L. Rodrigues)




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sábado, 11 de junho de 2016

Kid A – A Anti Música Do Radiohead







Em outubro do ano 2000, o Radiohead lançava seu quarto disco, Kid A. Passaram-se pouco mais de três anos desde que lançaram seu álbum anterior, Ok Computer, que mudou completamente o destino da banda que passou do risco de ser lembrada eternamente por uma única música (“Creep” de 1993) para se juntar aos deuses do Olimpo do Rock ao lado de Beatles, Stones, Pink Floyd, etc.
Então as expectativas para o disco seguinte eram altíssimas. Claro que todos sabiam que a banda tinha talento de sobra para lançar um grande álbum e ganhar o mundo novamente. Só não esperavam que seria como se outra banda estivesse nascendo.
A primeira música, “Everything in its Right Place” começa com sintetizador , uma voz tocada ao contrario e logo, o vocalista começa a repetir a primeira palavra “everything” até depois completar o título da canção. Canta calmamente, quase sussurrando e a voz ao contrario vai crescendo e ele começa a cantar mais alto, quase sem fôlego. O sintetizador vai encerrando a música, num atmosfera fria que te transporta para a colina da capa do disco.
Inicia-se a música “Kid A”, bem calmamente, como uma canção de ninar. Surge um sussurro de algo que se aparenta com a voz de um robô. Quando a música encontra mais ritmo, aí a voz se apresenta totalmente , é realmente a voz de um robô, com uns barulhos bem estranhos no fundo. A voz fica bem estridente e distorcida. O baixo começa a se destacar até um crescente sintetizador encerrar a canção.
Até aí quem estava esperando distorção de guitarras, orquestras e emoção estava no mínimo assustado. Resta saber se iria querer continuar a viagem ou se o choque foi grande demais.
“The National Anthem”, faixa seguinte, poderia dar uma acalmada em alguém nessa expectativa. Guitarra constante e por baixo vários efeitos característicos de Prog Rock, vocal normal do Thom Yorke...depois o choque: entra uma orquestra de metais e, logo começa a tocar de forma desordenada , com um instrumento mais estridente que o outo.
“How to Dissapear Completely” se inicia com uma espécia de trilha de filme de desespero (Tipo a que Johny Greenwood faria anos depois para o filme ``Sangue Negro`` de Paul Thomas Anderson) se sobrepondo a uma bela canção tocada no violão que vai crescendo. Assim vai a trilha de desespero se misturando com a bela balada e surge o sintetizador duelando com a voz.
“Treefingers” é uma faixa instrumental ambiente, que praticamente não leva a lugar algum. Talvez dá uma acalmada de tantas sensações estranhas.
“Optimistic” é a música mais “normal” até aqui, mais acessível, um rock. Mesmo assim não lembra em nada o Radiohead de outros álbuns. Mais tribal, mais orgânica. No final tem um trechinho dela mais dançante, quase Disco. Logo entra a introdução (como se fosse um alarme)   da próxima faixa, “In Limbo”. Totalmente um transe, parece ser de um ritual religioso, psicodélica, lisérgica - Viciante.
“Idioteque” é presença garantida nos shows até hoje. Batida pesada e marcante, misturada a outros efeitos eletrônicos e verdadeiro espetáculo vocal com as vozes de Thom se misturando. Aqui fica clara uma enorme influência da banda: Kraftwerk.
Em “Morning Bell” o  teclado dá o clima gélido e constante, mas o show é da bateria. É uma faixa bem sombria.
“Motion Picture Soundtrack” é uma faixa que começa muitíssimo triste. Mas logo entram sons de harpas e efeitos que imitam um coro angelical, acabando o álbum num clima de esperança. Logo escondida, uma vinheta que dá a impressão de inciar uma música, mas acaba apenas em distorção.
Kid A foi a tentativa de ser completamente o contrário dos seus álbuns antecessores. De não ser perfeito, emocionante, as músicas alcançarem clímax. O objetivo de fazer uma anti música, de ficar bem longe da perfeição.
Kid A chegou em primeiro lugar nas paradas dos E.U.A. e do Reino Unido. Foi indicado ao Grammy de melhor álbum do ano. E foi considerado por vários publicações (incluindo a revista Rolling Stone) como o melhor disco da década.



(Texto: Francisco Oliveira)




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quinta-feira, 9 de junho de 2016

Elis Regina - Elis (1973)







Em 1973, Elis resolveu virar o jogo. Depois de dizer que o país era governado por gorilas e ser chamada para prestar esclarecimentos, a cantora não teve como declinar do ´´convite´´ para cantar nas Olimpíadas do Exército. Resultado: passou a ser vista por parte do publico e da classe artística como uma conservadora entusiasta do regime, sendo incluida por Henfil no seu "Cemitério dos Mortos-Vivos" no "Pasquim" (o cartunista depois se arrependeria pela inclusão). Incomodada e disposta a modernizar-se, decidiu radicalizar. Rompeu o contrato com a Tv Globo, com o empresário Marcos Lázaro e gravou seu disco mais ousado.
Desde o fantástico Lp "Em pleno verão" (1970) que a cantora vinha modernizando seu repertório e aproximando-o de um som mais sofisticado, que culminou no antológico Lp de 72, que resultou em tantas interpretações memoráveis que hoje em dia parece uma coletânea. O Lp de 73 trazia ainda mais mudanças. Nada de concessões, nada de orquestrações, nada de gritos. Com a direção nas mãos do novo marido, César Camargo Mariano, o Lp contava com quatro músicas de Gilberto Gil, quatro da dupla João Bosco e Aldir Blanc, dois sambas repaginados e um conteúdo altamente político. O clima de mudança já pode ser percebido na capa: os sorrisos coloridos, frequentemente presentes nas capas de seus álbuns, davam lugar a uma Elis de cabeça baixa numa capa em preto e branco. O clima era de introspecção. 
"Oriente" de Gilberto Gil, abre o disco com o baixo de Luisão Maia e o teclado de César Camargo dando o clima de tensão e reserva. Elis, mais contida que nunca, faz uma interpretação precisa da música que seu autor classificou como sua música mais "auto-referente". Gravada no ano anterior por Gil apenas com o seu violão, a canção cresce com Elis e sua nova banda, apesar de um erro na letra. "O caçador de esmeraldas", uma brincadeira da dupla Bosco/Blanc com os nomes Fernão e Esmeralda em alusão aos bandeirantes, conta com a guitarra de Toninho Horta e bate na trave do fusion. "Doente Morena", música feita por Gil para um inacababo Lp que seria lançado em 1974 (foi mais ou menos lançado em 1999 com o título de "Cidade de Salvador"), é psicodelia política regada a teclados, guitarra, bateria e melancolia. "Agnus Sei", um dos pontos altos do Lp, música que lançou João Bosco no ano anterior, é crítica ao momento que vivia o país metaforizada com o período inquisitório. "Ah, como é difícil tornar-se herói,só quem tentou sabe como dói,vencer satã só com orações", canta Elis de forma espetacular enquanto Chico Batera e Paulinho Braga dão um show de bateria e percussão, Cesar brilha no Hammond e Luizão Maia faz bonito no baixo. "Meio de campo", um recado de Gil ao combativo jogador Afonsinho, é samba e jazz com o piano marcante de CCM, a divisão genial de Elis e mais críticas ao regime ("Fazer um gol nessa partida não é fácil, meu irmão!"). "Cabaré" é um jazz tango no melhor estilo Piazolla - que elogiou a gravação - com o bandoneon de Ubirajara da Silva (pai de Taiguara) a todo vapor e a cantora em mais uma interpretação magistral de uma letra recheada de críticas camufladas ao regime. "Ladeira da preguiça", samba feito por Gil no exílio a pedido da cantora, fala da lendária ladeira soteropolitana que liga o porto à Cidade Alta e cita outros lugares da Bahia. Destaque para o instrumental que vai saindo aos poucos de cena deixando a cantora terminar a música sem acompanhamento. Golaço! "Folhas secas", samba inédito de Nelson Cavaquinho, tornou-se um clássico da música brasileira. A música, feita especialmente para Beth Carvalho, foi tocada por Cesar Camargo, arranjador do disco da cantora, em casa e Elis ao ouvi-la decidiu grava-la. Autorizada pelo compositor, acabou furando o ineditismo de Beth que se chateou. Mas, enquanto a versão da sambista é puro samba, a de Elis está mais para uma bossa gilbertiana, com a presença, inclusive, do violão de Roberto Menescal (produtor do disco) e mostra que seu jeito de cantar samba agora era outro. "Comadre" tem letra enigmática e perfeição técnica e abre caminho para "È com esse que eu vou", o ponto alto do disco. O samba, sucesso em 1948 com o grupo Quatro Ases e um Curinga, é transformado, a partir de uma idéia de Menescal, em um envolvente cool jazz. Tecnicamente perfeita e guiada pelo envolvente sambalanço do piano do marido e guitarra de Toninho Horta, Elis não desperdiça um segundo, valoriza os silêncios e não exagera um milímetro. Canta com alegria. Relax. Um dos melhores momentos de sua vitoriosa carreira. Nota dez. O álbum não poderia ser encerrado de melhor forma.
Crítica e público não viram o disco com bons olhos e consideraram-o frio. No ano seguinte, a cantora ganharia de presente da gravadora, pelos dez anos de sua carreira, um disco histórico (e espetacular!) ao lado de Tom Jobim e prosseguiria sua carreira gravando discos verdadeiramente brilhantes ao lado de Cesar Camargo, fazendo shows inesquecíveis, encantando o mundo se apresentando no Festival de Montreaux, gravando o hino da anistia e encontrando, enfim, o caminho do meio entre o popular e o requintado. E essa obra-prima, uma das tantas de sua carreira, será sempre lembrada como um momento de plena sofisticação e ousadia.



(Leandro L.Rodrigues)
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segunda-feira, 6 de junho de 2016

Alceu Valença - C.E.U. Alto Alegre 04/06/2016








“A cultura está morrendo”. A certa altura de sua apresentação, Alceu Valença em tom melancólico, denunciou o estado moribundo em que se encontra a cultura hoje. Mas se isso está acontecendo mesmo, sua aparição no C.E.U. Alto Alegre pode ser encarada como uma dose extra de oxigênio para dar sobrevida a esse que é umas das bases da dignidade humana.
Com um pequeno atraso devido à chuva que contemplou as proximidades do Centro Educacional Unificado, Alceu adentrou ao palco e  uma plateia já eufórica o recebeu com muitos aplausos. O que se viu a partir de então, foi um carisma fora do comum que conquistou de cara a uma plateia bem diversificada onde podíamos ver pessoas de todas as idades. Não é preciso dizer que Alceu é um dos gigantes de música brasileira e que possui alguns dos mais  marcantes sucessos da MPB. E como não poderia ser diferente, foi exatamente isso que ele entregou à uma plateia orgulhosa por poder presenciar espetáculo tão singular.
Para abrir os trabalhos ´´Bodocó´´ que foi seguida por ``Pelas Ruas´´ deram o tom inicial da apresentação. Quando o musico ainda estava somente acompanhado de seu violão e antes de anunciar ´´Sino de Ouro´´ chamou ao palco Paulo Rafael (guitarra) e André Julião (Sanfona), e aí se iniciou uma viajem para os confins do nordeste, e para que essa viajem se materializasse, bastava fechar os olhos. ``Sabia´´ (Luiz Gonzaga) foi a homenagem prestada a um dos mais ilustres representantes da musica nordestina .``Coração Bobo´´ manteve a euforia dos presentes que acompanhavam cada musica com sorriso estampado no rosto.
Em certa altura do espetáculo, Alceu propôs aos presentes que fosse fundada a Igreja da Congregação Musical e com os presentes com as mãos levantadas entoou os primeiros acordes de ``Taxi Lunar´´, um clássico, composto com seus parceiros Zé Ramalho e Geraldo Azevedo. Já na parte final, mais um vez Alceu brinca com a platéia quando volta para o bis e sacramenta o que até ali já era ``jogo ganho``.  ``Como Dois Animais´´, ´´La Belle de Jour´´ (referência a obra prima de Luis Buñuel) e ´´Morena Tropicana´´ fizeram os presentes esquecer definitivamente o frio e a chuva que insistia em cair por aquelas bandas. Simplesmente memorável!


PS: Vamos aguardar agora por Zé Geraldo, que se apresenta no próximo dia 30 de Junho - O nível não para de subir!!


(Texto: Robério Lima)



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Uma Explosão Nuclear Musical








No final de abril deste ano, o mundo perdeu um de seus maiores artistas: Prince Rogers Nelson, ou simplesmente Prince. O corpo do lendário artista foi encontrado, justamente no seu icônico estúdio, Pasley Park, na sua amada cidade natal,  Minneapolis.
Perder num mesmo ano (nem na metade dele) dois artistas como Prince e David Bowie, é no mínimo assustador. Sinal de que resta cada vez menos do mundo mágico e encantador que pudemos conhecer.
Prince era filho de músicos e começou a compor ainda na infância. Quando lançou seu primeiro álbum, For You em 1978, já deixava sinais da revolução que iria causar na música pop: ele compôs, arranjou e tocou todas as músicas do disco, além de produzi-lo. Não obteve sucesso comercial ainda, mas ia adquirindo prestigio e notoriedade. No álbum seguinte que levava apenas seu nome como título, já obteve maior destaque e a música ¨I Wanna be Your Lover¨ se tornou seu primeiro hit. Suas músicas até então estavam entre o funk , R&B, e ainda tinha resquícios da Disco Music que, a essa altura já estava em seus últimos dias.
Seguem-se  álbuns como o aclamadíssimo Dirty Mind e Controversy que já exibiam um artista completo e inovador , além de polêmico, misterioso, sexy e controverso. Porém a explosão mundial só ocorreu com o disco 1999 , uma de suas obras-primas que revolucionou ao mesclar diversos gêneros como synth pop, funk, rock, soul.
Através do projeto Purple Rain, que se tratava de um filme ¨quase¨ autobiográfico e sua trilha sonora o artista alcançou o mega estrelato e não havia mais limites para suas glórias: muitíssimos milhões de discos vendidos, dezenas de prêmios, entre eles o Oscar de melhor canção, além de prestígio inabalável de toda a crítica mundial. Ele se tornou  então um dos maiores e mais importantes artistas dos anos 80.
Em 1987 lançou Sign O’ Times , para muitos sua maior obra. O músico lançou uma imensa e magnifica turnê que foi registrada num filme, de mesmo nome.
Ele seguia nesse ritmo intenso intenso, lançando discos ano após ano, revolucionando, fazendo dezenas de clipes e outros filmes.
Após anos brilhando com a banda Revolution (eles gravaram juntos de 82 a 86), Prince entrou a década de 90 com uma nova mega banda, a New Power Generation.  No ano de 91, outro álbum fabuloso: Diamonds and Pearls. O artista estava sempre inovando no seu visual, assim como sua talentosa banda. Vídeos belíssimos eram produzidos e o sucesso de público e crítica permaneciam.
Em seguida, a sua gravadora, Warner fechou o contrato mais caro da história, até então, para que ele permanecesse na companhia. Não foi o suficiente para evitar que o artista travasse uma batalha gigante para se livrar da mesma. Aparecia com  a palavra ¨slave¨(escravo) pintada no rosto. Lançou um álbum em 1992 cujo o título era um símbolo impronunciável. O mais incrível é que poucos anos depois ele adotou esse mesmo símbolo como seu novo nome. As esquisitices foram aumentando e assim ele foi se afastando do grande público e da mídia em geral. Continuou lançando álbuns sem parar , pois tinha incontáveis músicas guardadas para lançar por muitos anos. A partir de 2004  teve um retorno triunfal com o álbum Musicology e uma turnê disputadíssima. Ainda nesse ano entrou para o Rock n’ Roll Hall of Fame. Nos anos 2000 continuou lançando álbuns, em 2007 fez uma apresentação apoteótica no Super Bowl. Com o tempo, passou a proibir que seus vídeos fossem exibidos no You Tube, fato que talvez o afastou das novas gerações.
Prince não estaria facilmente numa lista de prováveis rock stars que morreriam tão breve. Jamais se falava de problemas dele com drogas ou álcool. Sua obsessão era com a perfeição, com sua obra. Talvez o excesso de trabalho duro por anos ininterruptos o tenha consumido. Nesses dias foi divulgado que a causa da sua morte foi devido a uma overdose de analgésicos. Era um feriado aqui no Brasil. Eu assisti um programa de notícias no canal  G1 em que chamaram um crítico musical para falar sobre o astro. Em dúvida sobre seu estilo ela perguntou ¨Pop, Rock...afinal como definir Prince?¨. O crítico respondeu rapidamente, mas não menos certeiro: “uma explosão nuclear musical”



(Texto: Francisco Oliveira)
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quinta-feira, 2 de junho de 2016

Cranial Crusher - O ABC Paulista Entra No Mapa do Crossover Mundial.










Desde de 2010 na ativa e com uma formação que conta com Renan(baixo e vocal), Lucas (Guitarra) e Guilherme “Fruto” (bateria) - o Cranial Crusher; oriundo de São Bernardo do Campo, vem desde então, aperfeiçoando com maestria seu som pesado e dilacerando tímpanos por onde passa. O power trio conta em sua trajetória com um um split - “Cranial Attack” em parceria com o Cerberus Attack, e o  EP “Necrópole”(2016) - lançado de forma totalmente independente e que rendeu um vídeo clipe da faixa título. Abaixo um papo bem descontraído com os caras da banda.


Salada Itinerante – Seis anos de estrada e  mantendo a mesma formação desde de o início. Sabemos que os ânimos em uma banda são muito complicados e a convivência em muitos momentos é o principal fator para uma dissolução. Nos conte o segredo dessa duradoura união?

[CxCx]: Nós já nos conhecíamos dos tempos de colégio, anos antes de formarmos o Cranial, então já rolava uma amizade forte de longa data. A gente conhece bem um ao outro e acho que isso facilita bastante a fortalecer a estrutura da banda, sabe. Uma banda formada por músicos/amigos tende a durar mais do que bandas formadas apenas por músicos. No nosso caso, a convivência não é um fator para dissolução, mas o contrário disso, saca? Nossa relação vai além do Cranial, a gente costuma sair juntos pra outros rolês e tal. Além de termos influências musicais bem parecidas, achamos que, no geral, o fator que nos mantém tocando juntos durante todos esses anos é justamente o fato de termos uma amizade sólida e também temperamento parecido. Pra nós, é fundamental a convivência e a camaradagem.
Mas como em todo relacionamento interpessoal, nós também nos desentendemos e brigamos às vezes, pois você acaba passando muito tempo junto, seja em rolês, ensaios, shows, viagens para outras cidades para tocar etc e isso sempre acaba gerando atrito, mas nada muito grave. A convivência é uma parada foda e vez ou outra sempre rola uns arranca-rabos né (risos!). Mas sempre tentamos passar a limpo qualquer princípio de estresse tudo sempre baseado no respeito.

SI – Vocês começaram fazendo covers de bandas consagradas, o que é normal no processo de desenvolvimento de uma banda. Qual foi o momento de ruptura para que vocês começassem a produzir um trabalho autoral e qual foi o impacto diante dessa mudança por parte do público que acompanha a banda?

[CxCx]: Exatamente, começamos em 2010 e covers de Black Flag, Ratos de Porão, Cro-Mags, Metallica, Slayer e etc foram um ponta pé inicial, mas a ideia da banda sempre foi fazer som próprio, por mais que no começo tenhamos começado tocando esses covers a fim de nos entrosarmos e estabelecermos as principais influências. Inclusive fizemos os primeiros shows tocando só covers. Mas chegou um momento que a gente sentiu uma maior sintonia e nos trancamos em casa, só compondo e os sons foram saindo naturalmente, dando origem ao split com o Cerberus Attack, o “Cranial Attack´´. Para aquelas pessoas que tinham nos visto em 2010 foi uma grande surpresa e sentimos que o resultado foi bastante positivo.




SI – Vocês já tiveram a oportunidade de dividir o palco com bandas que possuem reconhecimento mundial como Krisiun e Violator, coincidentemente duas das formações mais sólidas em atividade. Nos fale como foram essas experiências e qual a importância de oportunidades como essa para bandas mais novas na cena?

[CxCx]: Cara, foram dois shows animais e muito positivos, em todos os sentidos! Graças ao Tiago (Seventh Seal) e ao Kedley (Midnightmare), tocamos com o Violator em 2013 e com o Krisiun no ano seguinte, ambos os shows na nossa cidade, e foram experiências excelentes. Tivemos a oportunidade de conversar com os caras, que foram super humildes, trocar experiências e fazer shows com bandas que a gente curte pra caramba e são referência pra gente, então foi bem legal.

Particularmente, acho que oportunidades como essa são essenciais, não só pra bandas novas, mas bandas independentes no geral, que podem mostrar o som pra galera, ganhar um pouco de espaço e fazer novas amizades. O underground é um movimento enorme e fantástico, composto por bandas, organizadores, público, donos de bar, fotógrafos, etc e é de suma importância que eventos assim continuem rolando. Quer dizer, as bandas estão aí, com sangue nos olhos e querendo tocar, então eventos assim, que tirem as pessoas de casa e unam os amigos pra curtir um som são fundamentais.

SI – O EP ``Necropole´´ acabou de ``sair do forno´´. Como foi o processo de criação desse trabalho até chegarem ao resultado final? Nos fale também sobre a recepção obtida até o momento por parte desse trabalho.

[CxCx]: Com certeza foi outro passo enorme. Influenciados por Thrash Metal do final da década de 80 e início de 90, os sons desse EP tiveram uma dose extra de agressividade, com músicas mais diretas e riffs mais trabalhados, mas ao mesmo tempo sem deixar o nosso toque de crossover de lado. Geralmente nós três chegamos com ideias e riffs, juntamos tudo e assim as músicas vão tomando forma, esse esquema rola legal pra gente. Para o EP não foi diferente, ainda que o processo pré-gravação tenha sido um pouco puxado, fechando com gráficas, desenvolvendo as artes, fotos e etc. As composições fluíram muito bem e foi tranquilo chegar ao resultado final dos sons. Gravamos o EP no final de 2015 e já vínhamos trabalhando nos sons desde o começo deste mesmo ano, então já estávamos bem calejados. Foi só questão de chegar no estúdio e gravar.
A recepção da galera tem sido sensacional. O pessoal curtiu bastante e os shows têm sido insanos, então não poderia estar sendo melhor!

SI – Como anda o processo de divulgação desse trabalho? Existe alguma ação especial para promover o disco?

[CxCx]: Não existe uma ação especial para divulgar o EP recém lançado além do boca a boca, saca. Nós disponibilizamos os sons na internet (facebook, youtube, bandcamp e em alguns sites independentes) e por aí a galera vai sacando, passando pros amigos e tal. Nos shows nós vendemos cópias físicas e outros materiais também, o que ajuda bastante na divulgação!

SI – O EP foi lançado de forma totalmente independente. Vocês chegaram a procurar pelo apoio de algum selo para lançar o play?

[CxCx]: Sim, o EP foi lançado de forma totalmente independente e DIY pelo nosso selo, o The Funts Produções. Chegamos a entrar em contato com selos e distros de diversas regiões do Brasil, mas infelizmente até o momento não rolou nenhuma parceria. Se você tem selo/distro e estiver interessado em nos ajudar, é só mandar um salve pra gente!

SI – Além do diferencial de cantar em português, vocês abordam temas bastante presentes em nosso cotidiano. De alguma forma o atual momento político do país influenciou nas composições do EP. Qual a posição de vocês com relação à situação política e econômica em que o país se encontra?

[Renan]: Desde o início da banda, a ideia sempre foi cantar em português, que é a nossa língua nativa. Temos um som cantado em inglês, que foi o primeiro som de nossa autoria, mas é o único. Acreditamos que o nosso som não deve servir apenas pra falar de metal, mas sim para levar alguma mensagem ou reflexão às pessoas. Ao meu ver, o metal e o hardcore punk estão diretamente ligados a meios de protesto, contestação e contracultura, então nada mais justo do que representar isso nas letras também e levar algumas ideias àqueles que nos ouvem.

Em relação à atual situação do país, creio que vivemos uma situação fudida, um 2014 comparável a um 1984, ou até pior. Recentemente vimos realização de um pseudo-impeachment disfarçado de legalidade e regido por uma parcela da população de classe média/alta. Eu não defendo o governo dela, até por que muita coisa que ela fez foi errada sim, isso é inegável, mas não justifica tirá-la de lá. Além disso, recentemente saíram umas conversas de políticos explicitando o golpe, então só não enxerga quem realmente não quer ver. Pra mim, no geral, não é uma questão de partido A contra partido B e sim uma questão de nós contra o estado.

[Fruto]: Creio que nossos maiores públicos estejam na região do ABC e pelo Brasil, por conta disso, fazemos letras em português. Além de ser um desafio escrevê-las, é a forma mais direta de passar nossas convicções, servindo até como um meio de ativismo político e reflexão.

A situação político-econômica atual é complicada, tem várias coisas acontecendo dentro e fora do país, a crise é global. É difícil ficar a par de tudo. A interferência norte-americana nos Estados da América Latina sempre foi forte, tanto que como em 1964, o Brasil sofre um golpe novamente da burguesia nacional com o patrocínio de fora. Os ataques à classe trabalhadora vinham ocorrendo de forma moderada, porém agora, são muito mais intensos e a repressão também. Acredito que a melhor forma de resistir a isso é com a população se organizando pela base.  

SI – Voltando ao EP, achei que o novo logo da banda ficou animal. Como foi desenvolvida a arte do disco?

[CxCx]: Toda a arte do EP ficou animal mesmo, ficamos impressionados! Acredito que torramos o saco dos caras (risos)! A capa foi desenvolvida pelo Wendell, nosso amigo do ´´Eu o Declaro Meu Inimigo´´ lá de Recife. Queríamos englobar as letras e mensagens dos sons na arte capa, então surgiu algo como zumbis em um grande centro urbano e palavras de ordem e tal. A gente deu as primeiras ideias e ele teve total liberdade pra desenvolver a arte a partir disso. Foi uma troca de experiências muito legal! O novo logo foi desenvolvido pelo nosso amigo Umberto, do Helvetin Viemärit. As fotos ficaram por conta da nossa grande amiga Marcela Calif, que fez um trabalho excelente também! Com todos rolou um intercâmbio muito legal e eles conseguiram captar exatamente o que tínhamos em mente e expressar todo o conceito de protesto e contestação que surgiu no EP, seja musical ou liricamente falando.




SI – De forma quase simultânea ao lançamento do EP, vocês lançaram um vídeo clip da faixa titulo. O que me chamou a atenção, além do som (Claro!) foi que cada um de vocês veste uma ``peita´´ de bandas que também estão ralando no underground. Nos fale um pouco sobre essa relação entre as bandas.

[Renan]: Isso mesmo, lançamos um videoclipe pra faixa título do EP, “Necrópole”, que foi gravado e produzido pela galera do estúdio The Wave, o mesmo no qual gravamos o EP. É muito legal você citar esse lance das camisetas e do visual em geral, por que a ideia era justamente dar uma força e divulgar bandas que estão no mesmo corre que a gente! Claro que não daria pra usar camiseta de todas (risos), mas escolhemos algumas que temos relações bem próximas. Eu particularmente usei uma peita do Febre do Rato, banda de crossover dos nossos irmãos lá de Santa Isabel – SP a qual já fizemos alguns shows juntos, tanto em São Paulo quanto fora do estado. Os caras são super parceiros nossos e também estão tocando nos buracos por aí. Mas aproveitando a oportunidade, queria mencionar mais algumas bandas que ajudaram bastante a gente (não todas, por que seria impossível!): Bandanos, Midnighmare, Cerberus Attack, Mollotov Attack, Barbie Kill, Lobotomia, Thrashing, Disturbia Cladis, Seventh Seal e toda a galera da União Headbanger ABC e Brasil. Valeu mesmo!

[Lucas]: Eu acabei usando uma camiseta dos nossos amigos do Damnation City, parceiros nossos aqui de SP mesmo e que mandam um thrash metal direto e bem louco!

[Fruto]: A intenção era essa mesma (risos), ajudar a divulgar o trabalho dos caras que estão na correria conosco. São bandas que estamos tocando e fazendo rolês juntos por aqui, e também em outras cidades. Acredito que o Chaoslace é um dos grupo que mais dividimos os palcos e a ´´kombosa´´ nesses últimos tempos, a gente se ajuda bastante, então acabei usando uma peita deles.

SI – Para finalizar, gostaria de agradecer a entrevista com vocês e dizer que estamos aguardando o full length. Deixe suas considerações finais e qualquer outra informação que julgar pertinente.

[CxCx]: Gostaríamos de agradecer a todos do Salada Itinerante pela conversa, foi muito bacana trocar ideia com vocês! Fazemos parte de um movimento enorme que é o underground e somos só uma pequena parcela de tudo isso. Todos os envolvidos são essenciais pra que o movimento continue firme e forte. É o que sempre falamos nos shows, não importa se você é fotógrafo, dono de bar ou se você cola nos eventos pra curtir um som e agitar com as bandas, comprar material, fazer resenhas, entrevistas, vídeos e tudo mais, o importante é sempre apoiar e chegar pra somar! Muito obrigado a todos que nos dão uma força e estão nesse mesmo corre que a gente! O underground é isso aí, união e não competição!


Se quiser entrar em contato com a gente, é só nos procurar no Facebook ou mandar um e-mail para cranialcrusher@gmail.com. Valeu!



(Entrevista: Robério Lima)








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quarta-feira, 1 de junho de 2016

Janis Joplin - Pearl (1971)







 No dia 4 de outubro de 1970, Janis Joplin não apareceu para as gravações no Sunset Sound Studios em Los Angeles. Preocupado com o atraso além do normal, o produtor Paul Rothchild mandou que alguém fosse ao hotel à procura da cantora que também não atendia aos telefonemas. Chegando lá, encontraram-a morta em seu quarto com a boca sangrando, o nariz quebrado e $4,50 na mão.Causa oficial: overdose de heroína. Lendas e teorias da conspiração à parte, nesse dia a cantora colocaria voz em mais uma canção daquele que seria (e é!) seu melhor disco: o definitivo "Pearl".
Depois de explodir em 1967 no Festival de Monterey e conquistar o mundo à frente da Big Brother & the Holding Company, Janis acabou ficando muito maior que a banda e que o rock costa-oeste que eles faziam. Precisava ir além. Queria ir além. E o disco que estava gravando naquele outubro de 1970 era a realização desse desejo. Com Rothchild (que também era o produtor de The Doors)no comando e uma banda, a Full Tilt Boogie Band, capaz de acompanhar seu talento ("Finally, it's my band"), a cantora finalmente se sentia à vontade com o projeto do álbum, acompanhando de perto a produção. E se a morte acidental impediu que todas as canções fossem gravadas, o 80% que já estava terminado é o suficiente para fazer dele um clássico da música pop.
"Pearl" abre com "Move over", rock composto pela própria Janis, com um bom solo do guitarrista John Till, mostrando já na abertura a integração da banda com o canto rasgado de Janis; "Cry Baby", uma baladaça com a cantora fazendo uso de sua habitual intensidade num vocal arrebatador, traz de volta a atmosfera do Kozmic Blues Band; "Woman left lonely", uma baladona digna das divas do soul/jazz, que lembra muitas das gravadas por Elvis na década de 70, serve como uma pista dos caminhos que sua carreira poderia seguir. "Half moon" mostra mais uma vez a competência da Full Tilt, com destaque para o piano de Richard Bell e a guitarra de Till. Desnecessário falar da interpretação de JJ.;"Buried alive in the blues" encerra o lado A como uma espéice de tributo. Sem a voz da artista - ela a colocaria no fatídico dia - mas com sua presença sentida em cada nota. "My baby" é um blues com vocal rasgado no melhor estilo da cantora texana. "Me and Bobby McGee", canção de Kris Kristoferson, inspirada no filme "La Strada" de Felini,e que traz de volta o clima de Haight-Ashbury, chegou ao primeiro lugar das paradas e se tornou um dos grandes sucessos póstumos da história; "Mercedes Benz", composta por Janis em parceria com o poeta beat Michael McLure e Bob Neuwirth, é o ponto alto do disco. Cantada à capela - um minuto e quarenta e seis segundos de beleza ímpar - e gravada de uma vez (o único take gravado é o que está registrado no disco), a canção, cuja letra é uma prece recheada de ironia ao materialismo ("I'm counting on you, Lord, please don't let me down/Prove that you love me and buy the next round")- apesar que hoje em dia,orações dessa maneira são mais que comuns - foi a última música que a cantora pôs voz no disco - três dias antes de desencarnar - e, postumamente, virou uma de suas marcas registradas. "Trust me", de Bobby Womack, e "Get it while you can" são duas baladas arrasadoras que encerram o disco mostrando a força do canto vísceral de Janis.
"Pearl" foi o disco mais vendido da carreira da cantora e seu álbum melhor resolvido musicalmente. O canto de cisne à altura da discípula de Billie Holiday e Bessie Smith que inspira até hoje o cantar de uma legião de imitadores. A prova inconteste de que, por trás da imagem estereotipada que alimenta o mito, ao mesmo tempo em que deprecia a artista,havia talento. Muito talento.



(Leandro L.Rodrigues)
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