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sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Os Capitães à Deriva.





Um dos nomes mais conhecidos da literatura nacional, Jorge Amado, tem sido muitas vezes desprezado em alguns meios acadêmicos por ser considerado um best-seller e por, segundo alguns entusiastas do modernismo, focar a sua obra na Bahia e ter idealizado um tipo caricato do baiano. Confesso que por muito tempo estive contaminado por este pensamento, porém ao entrar em contato com a obra desse grande autor percebi que a sua criação literária vai muito além das adaptações feitas para a televisão de alguns de seus romances.
Em capitães da Areia, mais uma obra recentemente adaptada para o cinema, o autor aborda temas surpreendentemente atuais, embora o livro tenha sido escrito em 1937. O assunto e as questões sociais que o livro explora em profundidade são os mesmos da “cidade da Bahia” e de muitas outras cidades, do Brasil e da América Latina.
Este romance nos comove e faz pensar nas crianças desvalidas que vivem nas ruas das grandes cidades, abandonadas a sua própria sorte, quase todas órfãs de pai e mãe, filhos da miséria e do abandono. Jorge Amado construiu um microcosmo ficcional. Os personagens mais relevantes são meninos de oito a dezesseis anos que moram num velho trapiche abandonado no cais de Salvador, a “cidade da Bahia” que eles tanto conhecem em suas andanças e onde vivem atiradas à marginalidade, roubando e cometendo pequenos delitos para sobreviver e, quando detidos, são submetidos à humilhação, ao castigo e a tortura.
Este  grupo de desvalidos, conhecidos na cidade como Os Capitães da Areia, é visto pela sociedade local com receio e é tratado pelo Estado como um mal o qual deve ser  eliminado. Porém, a narrativa da vida de cada um dos capitães da areia, todas marcadas pelo abandono e pela miséria, vai revelando ao leitor que a sociedade que os teme e os despreza e a mesma que os criou. Apesar de situar suas narrativas sempre no mesmo espaço geográfico e cultural, no caso a Bahia, Jorge Amado utiliza este espaço e seus personagens típicos para abordar questões universais.
Os meninos que habitam o velho trapiche dividem uma mesma realidade e buscam sobreviver a ela de diferentes formas: um faz uso de sua deficiência física para comover famílias que o ajudam e que terão seus bens roubados pelo grupo, outro busca conforto na religião, através da qual busca redenção para seus pecados e que conta com a ajuda de um padre para seguir a sua vocação. O destino de alguns desses meninos também será diverso: um entra no cangaço, movido pelo seu desejo de vingança, outro entra na luta política, enquanto outro, o único letrado do grupo, segue sua vocação artística e torna-se pintor, retratando em suas obras a realidade da qual fez parte, Porém a grande maioria deles continua nas ruas a espera de um fim incerto.
Outro aspecto importante da obra é o lado humano dos personagens o qual é abordado em profundidade, revelando os desejos e angústias que são não só daqueles personagens desvalidos, mas de todo ser humano e que são encarados e vividos de acordo com a realidade de cada um. Enfim uma obra que merece ser lida e relida na qual encontramos as marcas literárias que fizeram de Jorge Amado  um dos nomes mais representativos de nossa literatura.  

(Texto: Nilton Aquino)

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