Tive contato com essa obra prima através de um grande professor de língua portuguesa, chamado Zaqueu. Aliás, não foi apenas esse livro que ele nos apresentou em sala de aula, ``Amor Nos Tempos de Cólera e ``Cem Anos De Solidão´´ fizeram parte dessa trilogia de descobertas.
``Crônica de Uma Morte Anunciada´´ foi publicado em 1981. Garcia Marques nos brinda com uma narrativa envolvente. O enredo é um prato cheio para Garcia Marques destilar todo o seu conhecimento da estrutura jornalística. O livro é narrado em primeira pessoa, mas o narrador não é onisciente, pois ele escreveu sua crônica, colhendo informações, opiniões e lembranças dos habitantes da vila de Riohacha. A crônica gira em torno das horas que antecederam o assassinato de Santiago Nasar, filho de um rico emigrante árabe que foi morto a facadas pelos irmãos Pedro e Pablo Vicário para honrar a família do vexame de ter tido sua irmã Ângela Vicário devolvida após a lua de mel com o misterioso forasteiro chamado Bayardo San Román. Santiago Nasar é tido como o culpado pela desonra, fato esse confessado pela própria Ângela.
Abaixo; um trecho da magistral narrativa desse gênio chamado Gabriel Garcia Marques.
"Assustei-me quando o vi pela frente", disse-me Pablo Vicário, "porque me pareceu duas vezes maior do que era”.Santiago Nasar ergueu a mão para aparar o primeiro golpe de Pedro Vicário, que o atacou pelo flanco direito com a faca na perpendicular.
- Filhos da puta! - gritou. A faca atravessou-lhe a palma da mão direita, e mergulhou de imediato até ao fundo do costado.
Toda a gente ouviu o seu grito de dor.
-Ai minha mãe!
Pedro Vicário puxou a faca para fora com o seu pulso rude de magarefe, e assestou-lhe um segundo golpe quase no mesmo lugar. "O estranho é que a faca voltava a sair limpa", declarou Pedro Vicário ao juiz instrutor. "Eu já lhe tinha furado pelo menos umas três vezes e não havia nenhuma gota de sangue ”.Santiago Nasar torceu-se com os braços cruzados sobre o ventre depois da terceira facada, soltou um gemido de bezerro, e tentou virar-se de costas. Pablo Vicário, postado à sua esquerda com a faca recurva, assestou-lhe então a única facada nas costas, e um jorro de sangue a alta pressão encharcou-lhe a camisa. "Cheirava como ele", disse-me. Três vezes ferido de morte, Santiago Nasar enfrentou-os novamente, e apoiou-se de costas contra a porta da mãe, sem a menor resistência, como se quisesse tão-só ajudá-los a acabar com ele em partes iguais. "Não voltou a gritar", disse Pedro Vicário ao juiz instrutor. "Pelo contrário: pareceu-me a mim que se ria." Os dois continuaram a esfaqueá-lo de encontro à porta, com golpes alternados e fáceis, flutuando no remanso deslumbrante que encontraram do outro lado do medo. Não ouviram os gritos da vila inteira espantada com o seu próprio crime. "Sentia-me como quando se vai à carreira num cavalo", declarou Pablo Vicário. Mas rapidamente despertaram ambos para a realidade, porque estavam exaustos, e apesar disso parecia-lhes que Santiago Nasar não iria cair nunca. "Porra, primo", disse-me Pablo Vicário, "sabes lá como é difícil matar um homem. Não fazes idéia!" Tentando acabar de uma vez por todas, Pedro Vicário procurou o coração, mas procurou-o quase na axila, onde o têm os porcos. De fato Santiago Nasar não caía porque eles estavam a escorá-lo à facada de encontro à porta. Desesperado, Pablo Vicário deu-lhe um talho horizontal no ventre, e os intestinos afloraram com uma explosão. Pedro Vicário ia a fazer o mesmo, mas o pulso torceu-se-lhe de horror, e então deu-lhe um talho extraviado na coxa. Santiago Nasar ficou ainda um instante apoiado contra a porta, até que viu as suas próprias vísceras ao sol, limpas e azuis, e caiu de joelhos.
(Texto: Sergio Silva)
Muito violento,não consegui ler,parece frescura,mas fazer o quê?
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